sábado, 31 de julho de 2010

Elenice Tamashiro, gerente do programa Changemakers da Ashoka

Por Bruno Camarão






Elenice Tamashiro

Gestora ligada a projetos sociais fala do desafio “Transformando Vidas Através do Futebol”


O esporte possui potencial para realizar transformações e apresentar inovações também no campo social? A resposta para a Ashoka e o programa Changemakers é positiva. E o trabalho dessa equipe de inovadores para planejar estratégias de mudanças e inspirar outros entusiastas não poderia deixar o futebol fora do contexto.

Nasceu, então, o desafio “Transformando Vidas Através do Futebol”, cujo objetivo é conhecer ideias inovadoras sobre como a modalidade coletiva mais popular do mundo pode alavancar o potencial dos jovens, fortalecer suas comunidades, impulsionar o desenvolvimento e acelerar mudanças na sociedade. O projeto é uma parceria da organização com a Nike, tradicional marca e fabricante de materiais esportivos.

“A experiência com este desafio, em âmbito global, demonstrou que existem projetos estruturados com resultados concretos, na forma como estão mudando vidas de milhares de pessoas através do futebol, com forte orientação educacional para fortalecer os jovens para aumentar sua participação cidadã e ajudar a desenvolver suas respectivas comunidades”, explica Elenice Tamashiro, gerente do programa Changemakers da Ashoka.

Além da responsabilidade com a questão da saúde dos jovens e o oferecimento de um caminho para a construção de uma cultura de paz e respeito à diversidade, o desafio tem a intenção de agregar cada vez mais pessoas para participar do “time”.

Como aponta Elenice, desde o dia 27 de julho qualquer internauta pode votar em um prêmio que distribui um total de U$ 90.000,00 para as melhores ideias que utilizam o futebol para a mudança social. O “Transformando Vidas Através do Futebol” tem 293 inscrições de projetos em 63 países, sendo 36 inscrições somente no Brasil.

Iniciativa da Ashoka, organização mundial, sem fins lucrativos, pioneira no campo da inovação social e trabalho e apoio aos empreendedores sociais, o programa Changemakers se desenvolveu com base no histórico e na experiência da organização e na crença da construção de uma sociedade global onde “todos podem mudar o mundo”.

Trata-se de uma comunidade on-line que identifica projetos inovadores e permite aos seus membros colaborarem entre si para encontrar as melhores soluções para os problemas sociais mais urgentes. Em época de Copa do Mundo, e de olho na edição de 2014, que será realizada no Brasil, a confiança é que novos pensadores se sintam mobilizados a dar sua contribuição ao planeta.

“O jovem é a força motriz de futuras gerações, podendo causar impacto positivo uma vez que ele receba acesso à informação correta, o caminho para se atingir determinado objetivo, um mundo de possibilidades que é o futebol. A modalidade pode oferecer para ele essa mudança de realidade, mostrar-lhe que é possível mudar, fazer acontecer, multiplicar as ações para impactar mais gente”, acredita Elenice, que aprofunda a discussão nesta entrevista à Universidade do Futebol.

Universidade do FutebolQual é a proposta essencial da Ashoka e quais os principais objetivos do programa Changemakers?

Elenice Tamashiro – A Ashoka é pioneira no campo da inovação social. A missão é contribuir para criar um setor social empreendedor, eficiente e globalmente integrado, e a visão dela é “todo mundo pode mudar o mundo”.

A proposta essencial da organização é provocar transformação social com prática do conceito do empreendedorismo social em vários campos de atuação, como saúde, educação, participação cidadã, direitos humanos, desenvolvimento econômico e meio ambiente.

A proposta é colocada em prática através da seleção e investimento em empreendedores sociais, criação de estruturas /sistemas que possam apoiá-los de maneira a expandir suas inovações (projetos inovadores) e provocar a mudança também através de suas comunidades – onde entra o conceito do “todo mundo pode mudar o mundo”.

O Changemakers é uma iniciativa da Ashoka, que se desenvolveu com base no histórico e na experiência da organização e na crença da construção de uma sociedade global onde “todos podem mudar o mundo". É uma comunidade on-line que identifica projetos inovadores e permite aos seus membros (inovadores - dentro e fora da rede Ashoka -, investidores e entusiastas) colaborarem entre si para encontrar as melhores soluções para os problemas sociais mais urgentes.

O “Changemakers é um sólido ‘laboratório’ para lançar, aperfeiçoar e ampliar novas ideias, permitindo aos membros de nossa comunidade mais oportunidades para que as mudanças ocorram mais rápido e de forma efetiva”.

Além do objetivo de aumentar as colaborações entre inovadores sociais do mundo inteiro, um grande objetivo do Changemakers é promover acesso democrático aos recursos aos inovadores sociais que participam dessa comunidade global on-line para que possam aumentar seu impacto no seu contexto local e global. Ou seja, visibilidade e oportunidade deles; oportunidade e visibilidade a inovadores sociais.

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Universidade do Futebol Você tem experiência em lidar com projetos, impactos e inovações na área social. Como ocorreu sua trajetória até chegar à Ashoka, com a gerência do programa de Changemakers?
Elenice Tamashiro – Durante a faculdade, onde estudei administração pública, tive a oportunidade de trabalhar com projetos sociais através da Jr. Pública, estágio em captação de recursos na própria EAESP-FGV. Tive algumas experiências em setor privado, estava em processo de decisão sobre qual caminho tomar na profissão, mas sabia que gostava mesmo é de trabalhar com o setor social.

Tinha curiosidade para saber mais sobre investimento social, como os inovadores sociais estavam atuando com seus projetos para melhorar a vida das pessoas, impacto no meio ambiente, etc.

Depois de uma experiência com investimento social comunitário onde desenvolvemos capacitação para lideranças locais, de oito cidades do estado de São Paulo, sobre mobilização de recursos (não somente financeiros, mas ativos da comunidade) para aumentar a sua base de sustentabilidade, voltei a trabalhar em setor privado porque queria uma experiência em consultoria que pudesse me ajudar a ter uma visão sistêmica e ajudar a trazer melhores e efetivas soluções para um determinado problema.

Embora não tenha tido uma vasta experiência com consultoria, havia algo que faltava no meu dia-a-dia. No final do trabalho, sempre queria saber qual era o impacto daquilo na vida das pessoas, quem estava ao nosso redor, etc. Foi quando surgiu a oportunidade me em juntar à equipe da Ashoka Brasil para estruturar a área financeira.

Éramos uma equipe pequena, o que nos permitia envolvimento em todos os tipos de atividades e exposição a variados temas, espaço para testar, criar novos processos. A Ashoka me proporcionou um grande desenvolvimento profissional que foi importante para ajudar a compor a equipe global do Changemakers.

Cada um de nós está em um canto do mundo, com uma dinâmica de trabalho on-line intensa (nem parece que estamos tão longe), mas com atividades e metas muito concretas.

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Universidade do Futebol Ainda está sendo montado um cenário dos projetos com as principais inovações dentro da realidade brasileira? O que você poderia falar dessa experiência com o projeto “Transformando Vidas Através do Futebol”?

Elenice Tamashiro – Creio que existe muito espaço para inovação considerando contextos locais, no sentido de que você sempre pode inovar levando em conta o que é relevante para a cultura de determinada região e comunidades.

A experiência com este desafio, em âmbito global, demonstrou que existem projetos estruturados com resultados concretos, na forma como estão mudando vidas de milhares de pessoas através do futebol com forte orientação educacional para fortalecer os jovens para aumentar sua participação cidadã e ajudar a desenvolver suas respectivas comunidades; para serem responsáveis com a questão da sua saúde; construção de uma cultura de paz; respeito à diversidade.

Além disso, a convocatória colaborativa também trouxe projetos inovadores, em fase de implementação, os quais demonstraram seu potencial de impacto e que certamente poderá chamar a atenção de outros membros da comunidade, como investidores sociais, para acompanhar e apoiar o seu progresso.

Universidade do Futebol Como funciona propriamente o desafio? Em que etapa o projeto se situa?
Elenice Tamashiro – Antes de lançar qualquer desafio colaborativo para o público, o Changemakers da Ashoka e o investidor definem o seu escopo e objetivos do desafio. Neste caso, em parceria com a Nike, o nosso norte era: de que forma o futebol poderia ser empregado para fortalecer comunidades, aumentar o desenvolvimento e conduzir mudanças sociais?

O cenário global era o de se inspirar a mudança social através do futebol, intenção de encontrar a próxima geração de líderes que estão usando o futebol para liberar o potencial dos jovens de forma que eles pudessem ajudar a fortalecer suas comunidades, impulsionar o desenvolvimento e promover a mudança social.


Então, o processo se dá em fases: definição do escopo; lançamento/convocatória (difusão do desafio na nossa rede de investidores, inovadores, organizações sociais e membros da comunidade on-line); participação da comunidade global on-line constante (nossa comunidade on-line participa com reflexões, comentários e sugestões junto às inscrições); painel de jurado (especialistas e referências internacionais de fundações, empresas, sociedade civil de diferentes regiões) que seleciona os finalistas do desafio; votação (campanha de mobilização para que toda comunidade global de inovadores possa eleger os ganhadores do desafio).

No dia 27 de julho deste ano, anunciamos os 12 finalistas do desafio e iniciamos a campanha de votação junto aos finalistas, novos parceiros (quanto maior número de parceiros engajarmos neste período, melhor). A novidade dessa edição do desafio é que a campanha tem uma forte estratégia de marketing on-line e redes sociais no mundo. Por exemplo, é possível votar em seu projeto finalista favorito pelo aplicativo do Facebook: http://apps.facebook.com/gamechangers-change.

É incrível, cada pessoa que possui perfil no Facebook pode incluir o aplicativo, votar e convidar os amigos para votarem. Isso também é uma forma de ajudar na mudança social. Votar é um ato de mudança! Cada voto conta e isso ajudará a aumentar o impacto do projeto em sua comunidade.

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Universidade do Futebol Este projeto é uma parceria entre a Ashoka e a Nike. Como se deu essa aliança?
Elenice Tamashiro – Basicamente é a terceira edição da parceria. Ele foi desenvolvido a partir do sucesso de dois desafios colaborativos que ajudaram a balizar as melhores ideias no campo emergente do esporte para a mudança social – os desafios “Esporte para um Mundo Melhor” e “GameChangers: Virando o Jogo para Mulheres no Esporte”.

Tanto através de suas parcerias na África para apoio a comunidades que lutam contra o HIV/AIDS, como em sua campanha “Apareça e Mostre sua Voz (Stand Up Speak Up)”, para empoderar fãs do esporte a manifestar sua oposição ao racismo, a Nike reconheceu há tempos o poder que o futebol tem de provocar mudanças reais.

Universidade do Futebol De que maneira a ideia da responsabilidade social voltada ao futebol se formou dentro da Ashoka? O que a instituição busca nesse sentido?

Elenice Tamashiro – Na verdade, a Ashoka e o Changemakers trabalham na identificação de soluções inovadoras para os problemas sociais mais urgentes do mundo junto com os investidores como a Nike (desenvolver potencial do jovem através do futebol, combate a HIV/AIDS, etc.), Rockefeller (desbloqueio de financiamentos para PMEs – neste, tivemos a adesão do G-20 na qual o governo do Canadá anunciou o investimento de U$ 20 milhões para os finalistas do desafio –, exemplo de acesso a democratização dos recursos) e Artemisia (buscava modelos de negócios sociais que melhoram a qualidade de vida de pessoas de comunidade de baixa renda).

O Changemakers é uma iniciativa da Ashoka que trabalha o investimento social estratégico junto com estes investidores de maneira a criar maior impacto social. O conteúdo gerado do desafio é uma das maneiras de mostrar as “tendências das barreiras que devem ser transformadas para que aconteça a mudança, bem como oportunidades e conceitos para se trabalhar o tema”.

Deste modo, a iniciativa Changemakers contribui, ajuda, orienta as empresas e fundações para o uso eficaz e mais estratégico do seu investimento social.

Universidade do Futebol O que você e a equipe do desafio concluíram sobre o tema “socialização do esporte” no Brasil e no mundo? Há diferenças a serem destacadas entre as propostas nacionais e as estrangeiras?

Elenice Tamashiro – O esporte cada vez mais se mostra como uma frente, um caminho para trazer maior impacto social. Ele trabalha a colaboração, a auto-estima, fortalecimento de comunidades e aumento de sua participação como cidadãos (em seus direitos e deveres), respeito à diversidade, empoderamento econômico, etc.

Creio que há poucas diferenças entre as regiões no mundo. Foi muito interessante ver como os projetos de futebol, para provocar a mudança, trabalham de modo transversal a diversidade (gênero – quebra de estigma da mulher no esporte; pessoas com e sem deficiência/times mistos de meninos e meninas na mesma equipe, por exemplo, para fortalecer técnicas do jogo com base no respeito ao outro;), cultura de paz, competências do esporte (trabalho em equipe, liderança, etc.), que podem levar a um bom desempenho profissional, etc.


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Universidade do Futebol O cenário atual do mundo é também inspirar a mudança social por intermédio do futebol? Em sua opinião, como liberar o potencial de jovens, para que estes fortaleçam suas comunidades, alavanquem o desenvolvimento e promovam mudanças?

Elenice Tamashiro – Acho que pelo esporte, em geral. O futebol é o mais popular, deve ainda mais chamar atenção agora para a Copa de 2014, é uma boa oportunidade para que a sociedade civil brasileira também pense qual seria o legado social de grandes eventos como este.

Existe uma rede, chamada REMS – Rede de esporte para mudança social –, idealizada inicialmente pela Nike. Trata-se de um grupo de organizações sociais focadas no esporte que trabalham incansavelmente sobre a importância do esporte na criação e aumento do impacto social. Ele discute e propõe uma agenda comum para o legado social do esporte no Brasil.

O jovem é a força motriz de futuras gerações, podendo causar impacto positivo uma vez que ele receb acesso à informação correta, o caminho para se atingir determinado objetivo, um mundo de possibilidades que é o futebol. A modalidade pode oferecer para ele essa mudança de realidade, mostrar-lhe que é possível mudar, fazer acontecer, multiplicar as ações para impactar mais gente.

Universidade do Futebol No esporte, de que modo pode-se trabalhar a questão social sem decair no mero assistencialismo?
Elenice Tamashiro – Vale também o bom e velho clichê do “ensinar a pescar”. Se você oferece oportunidades e acesso a informações, aposta no potencial das pessoas, por exemplo, o que o treino, o jogo podem oferecer para desenvolvimento das competências pessoais que podem ser praticadas no seu dia-a-dia, elas serão capazes de “criar um negócio do pescado”, desenvolver a melhor “cadeia de produtiva do pescado” em colaboração com cada elo de produção da cadeia, porque um dia tiveram essa oportunidade e poderão repassar a mesma ação para frente.

Universidade do Futebol Também a partir de sua visão profissional e acadêmica particulares, de que forma o processo da educação auxilia no desenvolvimento do raciocínio, da criatividade e na compreensão dos fatores externos vividos pelas pessoas?

Elenice Tamashiro – Todo processo educacional (de mudança de hábito/comportamento) é crucial para o desenvolvimento do ser humano. Deve ser um processo que traga consciência nas atitudes e que tipos de impactos pode resultar (dependendo da atitude que tomar e sua responsabilidade nisso), que possa gerar reflexões que orientem para possíveis soluções (individuais ou coletivas) de problemas urgentes.

Acho que cada um nós, uma vez que se propõe a participar de qualquer processo educativo e aceita praticar a mudança de um padrão, por exemplo, este não deve ficar no discurso, e sim ajudar a desencadear atitudes coerentes em relação às pessoas que estão ao seu redor; que o aprendizado de um processo educativo possa ser aplicado em vários setores da vida, como usar o aprendizado e transformá-lo/adaptá-lo na profissão, na sua vida pessoal, na relação com o outro.

Cada indivíduo se permite aplicar a criatividade em outros setores a partir de um processo educacional: se bem concebido por quem propõe e bem absorvido por quem o recebe – e de qualquer maneira, acredito que nunca deve ser um processo de mão única, mas um processo educacional pela troca de saberes, de aprendizagem, de colaboração –, acredito que esta é melhor forma de educar.

Universidade do Futebol Você acredita que é possível pensar a formação de jovens jogadores de futebol sem a criação de um programa que gerencie o crescimento pessoal, social e profissional de modo interdisciplinar?

Elenice Tamashiro – Essa é uma opinião muito, muito pessoal, sem um fundamento teórico ou pedagógico. Eu acredito que formação de jovens jogadores que tenham programas de desenvolvimento acoplados (onde podem aprender e compartilhar aprendizados) será a melhor forma de fortalecer cada indivíduo em seu papel ativo de cidadania (consciente dos seus direitos e deveres), para tomar boas decisões em relação a sua vida (pessoal/profissional), de contribuir para o desenvolvimento de sua comunidade de uma maneira mais sustentável e estruturada.

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